Conversamos com o Black Country, New Road sobre como eles enxergam o próprio som e qual o roteiro de um date perfeito em Londres

Black Country, New Road, uma das bandas mais interessantes do cenário de post-punk revival, chega ao Brasil no meio de maio de 2023 para se apresentar no C6 Fest, novo festival que conta com edições em São Paulo e no Rio de Janeiro.

O Black Country, New Road antes mesmo de lançar seu álbum de estreia já chamava atenção da crítica britânica. O som que começou ligado à cena de post-punk revival, de bandas recentes como Black Midi e Squid, aos poucos foi tomando uma forma mais épica e melódica, mais puxado para o rock alternativo. Os dois primeiros álbuns, For The First Time (2021) e Ants From Up There (2022) contavam com o vocalista e guitarrista Isaac Wood. Numa nova configuração, a banda lançou nesse primeiro semestre Live At Bush Hall, um material que segundo eles, não era pra ser um álbum, muito menos um álbum ao vivo, mas que marca uma nova fase da banda, com o vocal sendo compartilhado entre os seis membros entre as músicas. 

O nosso papo rolou com o Charlie Wayne (baterista), a Tyler Hyde (baixista) e o Luke Mark (guitarrista), sendo que todos eles também cantam. Confira abaixo nossa entrevista com o Black Country, New Road.

Maria (MI): Para começar, que tal vocês se apresentarem, dizendo o que cada um faz na banda?

Charlie Wayne: Eu sou o Charlie, e toco bateria.

Tyler Hyde: E o banjo!

Charlie: Sim, e o banjo também.

Tyler: Eu sou a Tyler, toco baixo e canto. Ah, e eu também toco guitarra.

Luke Mark: Sou Luke, e sou guitarrista.

Charlie: E backing vocal também, hein…

Luke: E backing vocal também, verdade (risos). É isso, é isso.

 

Binha (MI): Eu conheci vocês em 2019 em um vídeo ao vivo no YouTube. Quatro anos depois, vocês lançaram o ‘’Live at Bush Hall’’ no YouTube e comentaram em uma entrevista que não planejavam disponibilizar nas plataformas de streaming, mas até hoje, a gente percebe que a banda continua ganhando novos fãs a partir dos vídeos no YouTube. Por que a música ao vivo é tão importante para vocês?

Luke: Hm, eu não sei… eu acho que antes de ser conhecido o suficiente, ou ter recursos financeiros suficientes para gravar, tocar ao vivo é a única coisa que dá pra fazer. Então quando se está no começo, aprendendo a fazer música, você pensa principalmente nela sendo tocada  ao vivo, pra depois aí sim começar a pensar em como fazer coisas boas para uma gravação em estúdio. São habilidades diferentes. E, enfim, acho que fizemos isso bem antes, mas é algo completamente  diferente. Eu acho que o jeito como nos conectamos com a música vem muito do ao vivo, tanto tocando quanto  assistindo. Então [o ao vivo] é a nossa base.

Tyler: E nós só gravamos ao vivo até hoje. Geralmente. Nós obviamente adicionamos overdubs e fazemos alguns ajustes, mas tudo o que já fizemos foi com todos juntos na mesma sala tocando ao mesmo tempo. Essa é a única maneira que realmente sabemos como escrever e gravar música.

 

Luan (MI): Falando sobre ao vivo, o Live At Bush Hall é um álbum muito importante, como um álbum de estúdio mesmo para os fãs. Então, que álbuns ao vivo vocês gostam como se fosse um álbum de estúdio, que é importante para vocês, ou uma inspiração?

Luke: Que difícil…

Charlie: Isso é difícil. Quer dizer, eu acho que nós realmente não pensamos sobre ele assim. Acho que ele [Live At Bush Hall] é mais ou menos assim [um álbum ao vivo]. Nunca foi nossa intenção que parecesse que estávamos lançando como um álbum ao vivo mesmo, nunca como…

Tyler: Um álbum propriamente dito.

Charlie: Sim. Mas é, a gente não pensa nesse material como um álbum. Porém sim, com certeza temos nossos álbuns ao vivo preferidos.

Luke: Eu não sei, tô tentando pensar, mas não me vem nenhum à mente. Tipo, sei lá, é uma questão pra mim, não costumo ouvi-los. Nunca.

Tyler: Pra mim são os da Nina Simone.

Charlie e Luke: Ah, sim!

Luke: Justo. Mas eu nem penso nesses como discos ao vivo, porque no jazz os discos sempre são “Live at…”

Charlie: Eu gosto muito do Live Nassau Coliseum do Bowie (gravado em 1976, lançado em 2017). É incrível! Tem um também, do Grateful Dead, Europe ‘72, uma coletânea ao vivo muito boa, da turnê europeia deles em 1972.

Luke: Pra falar a real, tem um álbum ao vivo do Neil Diamond que é, eu realmente gosto disso (risos). Mas nenhum dos meus álbuns favoritos são ao vivo, na real.  Mas tem um muito bom, meio doido, mas não consigo lembrar o nome dele. E até mesmo esse, é cheio de overdub, então é como se fosse um álbum de estúdio mesmo. O som é maravilhoso, mas aquela vibe de som de ao vivo é difícil de acertar. Rust alguma coisa o nome? Não consigo lembrar, é dos anos setenta.

Tyler: Sim, mas de qualquer forma, não tem um álbum ao vivo que nos influenciou, porque [Live At Bush Hall] não foi feito para ser um álbum. Portanto, nada influenciou o estilo em que estávamos gravando esse. A única razão pela qual gravamos ao vivo foi para tentar 

evitar que ele seja rotulado como um álbum. O que obviamente não conseguimos evitar. As pessoas ainda vão falar sobre isso como um álbum, mas é muito menos comparado aos nossos álbuns anteriores por causa do formato. 

Luke: Essa era a ideia. E meio que funcionou, a galera ainda curtiu o som, que é o mais importante.

 

Maria: Ah sim, os fãs gostaram, com certeza. Nós também adoramos. Vocês colaboraram recentemente com a Ichiko Aoba, tiveram o breve projeto de Black Midi, New Road. O que vocês acham que tem em especial em colaborar com artistas para além da banda? Como funcionam essas colaborações para vocês?

Charlie: Eu acho que, não sei, talvez vocês vejam de forma diferente, mas não acho que somos uma banda que colabora com frequência. Mesmo sabendo que de certa forma isso faz sentido. As coisas que rolaram nesse sentido foram devido às circunstâncias, tipo no caso da Ichiko Aoba, que estávamos tocando no mesmo festival, e surgiu a oportunidade de fazermos algo, mas não foi algo que procuramos. 

E o Black Midi, New Road, rolou porque eles são nossos amigos. Originalmente era pra um projeto da faculdade do Lewis (saxofonista). Ele precisava fazer um projeto de um show que esgotaria. Então fizemos.Foi num lugar pequeno, obviamente esgotou, foi um lance meio que pra caridade também. Então não foi algo sobre música necessariamente, mas sobre curtir, algo socialmente divertido entre músicos com quem nos damos bem e somos fãs. 

Mas voltando à Ichiko Aoba. Foi muito melhor do que imaginávamos, porque não tivemos muito tempo para nos prepararmos para isso. E talvez seja uma prova do fato de que nossas músicas são estruturalmente muito inflexíveis e ela disse, “você sabe, poderíamos fazer algo sem interferir muito nisso”.

Tyler: Mal temos tempo suficiente para escrever para nós mesmos. Então, a ideia de fazer mais colaborações agora é assustadora. É muito para pensar. Mas eu aprecio o benefício da colaboração. Tipo, eu posso nos ver no futuro nos juntando em um grupo mais fechado de pessoas e músicos. Então, um dia tenho certeza que isso vai mudar, mas, meu Deus, simplesmente não temos tempo.

Luke: Tentando colaborar com nós mesmos (risos).

Tyler: Comigo mesma, com a minha mente.

 

Luan: Geralmente, quem tá conhecendo o som de vocês tem a impressão de que é um som “sério”, meio complexo. Como vocês veem o ‘mood’ do som de vocês, algo mais sério, ou nada muito específico assim? E o que é pra vocês “som sério” e “som de jovem”?

Tyler: Acho que ‘música séria’ não é necessariamente triste ou sombria. Ou música sombria, séria, é apenas música que se leva muito a sério. E gostamos de pensar que não nos levamos muito a sério, mesmo em momentos tristes e sombrios. No momento, acho que não somos uma banda ‘séria’. Nós nos respeitamos, mas não nos levamos muito a sério. Faz sentido?

Charlie: Sim, eu acho que você pode fazer música que é de altíssima qualidade sem necessariamente pensar nisso de uma maneira específica e pomposa. Eu acho que as relações musicais podem ser complexas, interessantes e bem desenvolvidas sem serem consideradas ‘sérias’ ou ‘arrogantes’. No geral não é isso. E também podem ser incrivelmente emocionais.

Tyler: Tem que ser equilibrado com um pouco de bobagem.

Luke: Sim, com um pouco de diversão. 

Charlie: Não estamos tipo escrevendo música juntos em uma sala,olhando uns para os outros intensamente quando estamos escrevendo as músicas (risos). Quando estamos escrevendo música juntos, é na verdade uma atmosfera bem leve. Eu acho que a música pode conter pluralidades, ser muitas coisas diferentes. E não precisa ser ‘sério’ para ser bom.

Luke: Sim, mas nossa música definitivamente soa séria. Quantas músicas lançamos, tipo 20 ou algo assim? Eu diria que 18 delas são ‘sérias’ (risos). Mas tipo, tem letras engraçadas. Há momentos musicais engraçados ou, pelo menos, momentos musicais divertidos e leves. Brincadeiras, escolhas lúdicas e outras coisas. E isso é provavelmente por causa da atmosfera alegre, porque muitas das músicas inicialmente vêm de um lugar sério. 

E eu acho que também tem a ver com isso, nós sempre escrevemos nossas músicas enquanto as tocamos muito.. E tipo, você não vai estar com o mesmo humor que estava quando escreveu a música todas as vezes que tocá-la,isso te permite sair um pouco desse sentimento.. Você torna  o processo um pouco menos sério. Você não precisa estar sempre sentindo a mesma emoção para tocá-la ao vivo

 

Maria: Temos aqui algumas perguntas de fãs também! A Kauane, de Florianópolis, diz que é muito grata a vocês por tudo, e pergunta se vocês tem outras paixões ou hobbies no mundo das artes, além da música. Vocês tem?

Tyler e Luke: Ah sim, com certeza. Curtimos várias coisas (risos).

Charlie: Estamos sempre conversando sobre isso (risos). Eu acho que uma das partes realmente boas sobre trabalhar com isso é que não é um horário comercial, com uma rotina fechada, e isso significa que você tem momentos em que não está ocupado. Isso significa que seu tempo pode ser preenchido fazendo o que você quiser. Gosto bastante de passear por Londres, onde moramos, e de ir às galerias porque elas são gratuitas e há sempre um monte de coisas interessantes acontecendo. Sim, eu faço isso bastante. Eu não seria capaz de dizer o que eu gostei recentemente porque seria muito embaraçoso, mas…

Tyler: E a gente é meio cinéfilo também, sempre vamos ao cinema hehehe. E quando podemos, gostamos de jogar boliche. Parece até um roteiro de date… Um ótimo date. Comece na galeria. Em seguida, vá ao cinema e depois  para o boliche tarde da noite.

Charlie: Uma ótima ideia realmente.

Luke: E tem uma pista de dança no boliche!

Tyler e Charlie: Verdade!

Luke: Pois é, acho que dentro da banda a gente gosta de tudo, sabe, tem gente que curte todos os campos da arte de várias formas (risos).

Charlie: Arte, cultura…

Tyler: Sim. Esportes também, futebol….

 

Binha: A segunda pergunta vinda dos fãs é do Denner, que é de São Paulo. A pergunta é: no primeiro álbum (For The First Time, 2021) , o som de vocês era mais dissonante e pesado, no segundo álbum (Ants From Up There, 2022) as músicas ficaram mais melódicas, e agora com o último trabalho, ainda mais. Essa mudança foi proposital?

Charlie: Hm, sim, eu acho que sim. Todas as escolhas musicais nos álbum, como o tipo de som, a abrangência, foi proposital.

Tyler: Em qual álbum?

Charlie: Tipo, no For The First Time e no Ants From Up There o som era..

Tyler: Bem, eu acho que o som do primeiro álbum foi ‘acidental’ em diversas formas

Charlie: Acho que sim, mas também foi proposital, foi definitivamente encontrando o nosso som, mas acho que muito desse som estava envolvido em shows ao vivo e esses são muito mais fáceis de se destacar se forem realmente potentes e um pouco sinistros. Pelo menos é assim que eu vejo.

Tyler: Mas eu sinto que o produto final do primeiro álbum não foi algo que nós necessariamente pensamos enquanto escrevíamos as músicas.

Charlie: É, acho que sim. O terceiro álbum provavelmente será um pouco mais próximo, em termos de processo de pensamento, como o segundo álbum, Ants From Up There. For the First Time e Live at Bush Hall são álbuns nascidos da ocasião, da mesma necessidade de criar música juntos, fazer shows, em vez de escrever um álbum que consegue se sustentar com todas as músicas carregando seu peso.

 

Maria: Agora a última pergunta de um fã, o Gab de Brasília: como tem sido a dinâmica de escrever e compartilhar o vocal das músicas entre toda a banda? Vocês pensam em escolher alguém fixo para os vocais ou continuarão assim?

Tyler: Veremos. Quero dizer, até agora, tudo bem. O objetivo final, o sonho, antes de Isaac (ex-vocalista) sair, era ter a opção de pessoas diferentes cantarem. Queríamos ouvir vozes diferentes em algum momento. E agora esse sonho se desenvolveu para que haja pessoas suficientes cantando e canções suficientes para que, se uma pessoa estiver tendo um dia ruim e não quiser cantar, ela possa simplesmente dizer que não quer cantar hoje, e isso é totalmente ok E estamos caminhando para isso.

Agora temos quatro de nós cantando e estamos trabalhando em mais. E, sim, está indo muito bem. Isso tira a pressão. Quem quer que esteja cantando sabe que não precisa estar nessa responsabilidade toda noite sabe, o que infelizmente é mais ou menos o que acontece quando você é o vocalista. Embora nunca tenhamos sido uma banda sobre uma  única pessoa, todo mundo aqui é igual, 100% igual. Quando se trata do ambiente ao vivo, o público não olha para a banda dessa forma. Infelizmente. Não tem como controlar isso. Mas isso mudou muito desde que começamos a revezar o vocal.

 

Maria: Infelizmente nosso papo acaba por aqui, mas obrigada pelo tempo de vocês, estamos muito animados para o show no domingo! E se precisarem de alguém pra dar um rolê por São Paulo, pode chamar a gente!

Binha: Sim! legal demais que vocês finalmente virão pro Brasil!

Tyler, Luke e Charlie: Ah, sim, finalmente! ficamos muito felizes! Obrigado também!

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Autores

  • Luan Gomes

    Viciado em descobrir sons novos e antigos, mas sem abrir mão de uns hits batidos tipo "The Real Slim Shady" do Eminem. Perde um dia de vida toda vez que vê a pergunta "o rock morreu?"

  • Binha Sakata

    aka Binha, sou apaixonade por música e audiovisual e resolvi unir esses dois elementos para pesquisar e falar sobre música, principalmente a independente brasileira e internacional. Em 2015, comecei a fotografar shows, em 2019 entrei para o projeto audiovisual e podcast de entrevistas Culture-se (@pculturese) e em 2020 criei o programa musical de rádio DSCOTECA (@dscoteca). No Minuto Indie, já fiz de roteiros a apresentações e conteúdos.

  • Maria Luísa Rodrigues

    mestranda em comunicação, midióloga de formação e jornalista de profissão. no Minuto Indie desde 2015 e em outros lugares nesse meio tempo.

Escrito por

Luan Gomes

Viciado em descobrir sons novos e antigos, mas sem abrir mão de uns hits batidos tipo "The Real Slim Shady" do Eminem. Perde um dia de vida toda vez que vê a pergunta "o rock morreu?"