Relatos de afeto para celebrar os 10 anos do disco de estreia de Cícero
Não é esquisito perceber que um disco completou dez anos? 10. X. IIIIIIIIII. Além da óbvia constatação de que o tempo passa, o aniversário de um disco é sempre uma nova oportunidade de visitá-lo e dessa vez com o carinho (ou ódio) que são frutos do privilégio do distanciamento em espaço e tempo. Quando Cícero lançou o álbum Canções de Apartamento em 2011, ele não estava pensando na obrigação de um auto isolamento que viriam dez anos depois ou até mesmo no impacto que essa obra teria na formação musical da juventude indie carioca – e também mundo afora. Até quem não gostava do Cícero sabia pelo menos uma música desse disco para poder falar mal. Curiosidade aleatória: o Minuto Indie em uma época teve um fã clube chamado “Minuto Indie do Cícero”. Ele estava lá, estranhamente onipresente.
Mas esse não é um disco com cara de 2021, de forma alguma. É quase ingênuo demais pra esses tempos, pacífico demais, com dúvidas e devaneios que mal cabem na rotina de hoje. Ele foi feito para 2011, para formar a galera que dizia que seu filme favorito do ano de 2014 foi Hoje Eu Quero Voltar Sozinho, para a juventude universitária pseudo intelectual que achava que ouvir Caetano é poético demais, para quem postava saudades de Los Hermanos, para quem queria ter o que discutir com os amigos, para entusiastas do termo “nova MPB”, para eles: os (insuportáveis) indies do começo da década. Com exceções, claro.
Mas ao revisitar este trabalho, ainda é possível se pegar pensando sobre versos como “nem sei dessa gente toda, dessa pressa tanta, desses dias cheios” de Vagalumes Cegos, quando hoje isso é tudo que a gente mais quer de volta, ou “e diz que só queria descansar de quem a gente mesmo escolheu ser” em Eu Não Tenho Um Barco, Disse A Árvore. Cansados, em casa, meio tristes, com dias agridoces, isso a gente consegue entender. Porém ele também serve para aqueles três minutos de esperança, para imaginar ser a Letícia Colin andando por Santa Teresa como em Tempo de Pipa e seu refrão chiclete “mas tudo bem, o dia vai raiar pra gente se inventar de novo”.
Não à toa esse disco segue em muitas listas de favoritos e ninguém melhor para falar sobre isso do que as pessoas que foram impactadas por ele. Fruto de uma saudade de sentar num lugar e ouvir as pessoas falando sobre discos que elas curtem, compilamos alguns relatos sobre a relação da galera com o Canções de Apartamento, seja da nossa equipe ou de leitores/espectadores/ouvintes do MI, e você pode conferir alguns desses abaixo.
Encontros e desencontros, por Maria Karolyna
No show do Cícero, era pra eu pedir uma pessoa em namoro e acabei não pedindo. Na mesma noite eu conheci o moço que eu namorei por três anos, isso lá em 2016. Tipo eu senti alguma coisa meio doida dizendo que não era pra eu fazer isso, sabe? E na mesma noite eu conheci alguém num show dele. Era numa sexta-feira o show e ele cantou “Ponto Cego”. Eu lembro direitinho dele cantando mais alto e todo mundo acompanhando “é sexta-feira, amor” e, por mais que eu seja lésbica, esse meu namoro de três anos foi muito feliz. Uma eterna sexta-feira.
Uma segunda chance, por Leonardo Baldez
Fui apresentado a esse álbum em 2011. Ouvi uma vez. Achei legal mas esqueci/deixei pra lá…. Quase dez anos depois passei por um término que me deixou mega na merda. Ouvi o Canções de Apartamento pela segunda vez e ele fez tanto sentido que viciei pra sempre. Tá entre meus favoritos hoje em dia.
Quem é moderno aí, meu?, por Luan Gomes
Foi um dos primeiros álbuns que ao escutar eu pensei: “pô, MPB pode ser moderna também” kkkkkkk Na época eu não tinha noção, mas essa impressão vem da mistura que ele consegue trazer entre ritmos mais minimalistas mesmo, com referências de Arcade Fire, Radiohead, e outras paradas que fazia ele soar como algo novo realmente. Muitos discos de “brasilidades” dessa época não envelheceram tão bem, mas esse ainda faz bastante sentido pra mim.
Em família, por Joaquim Júnior
“Tempo de Pipa” marcou uma fase muito especial da minha vida, de quando eu comecei a morar junto da minha mulher e dos meus filhos, pois eu ouvia a música pra me reconectar comigo mesmo e tentar entender o quão complicado era conviver com um outro alguém.
Nunca é tarde, por Nice
Eu ouvia em 2014 e não sofria por ninguém, porque não tinha ninguém, agora eu sofro.
Talvez possa ser tarde, por Lincoln Guedes
Eu conheci o Canções por conta do “Hoje eu quero voltar sozinho”, a Vagalumes Cegos faz parte da trilha sonora (essa é uma faixa que escuto até hoje). Naquela época eu estava muito sensível por conta de descobertas e incertezas no âmbito da minha sexualidade, e o álbum foi algo que me trouxe uma enorme calma naquele momento. A leveza que as músicas passavam eram de um conforto que eu precisava, sabe? Quando li sobre o aniversário do álbum eu confesso que fiquei com vontade de escutar o álbum mais uma vez, mas também estou com um pouco de medo de achar ele chato kkkkkkkk ele marcou uma parte do meu passado? Sim. Mas meu estilo musical mudou tanto que não sei como reagiria as outras músicas dele.
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