Lagum ao vivo em Santos-SP, janeiro de 2023. Foto: Daniel Seiti

Ao Minuto Indie, a banda abre o jogo sobre sucessos, se diz madura e exalta carinho dos fãs; Quarteto lança novo EP nesta quinta-feira (16), às 21h.

Há minutos do início de mais um show da sua turnê e sob o calor, do público que lota a arena e do verão de Santos, no litoral paulista, a Lagum abre a porta do seu camarim fresco e climatizado para mim. Com um sorriso no rosto e um aperto de mão, o líder do quarteto, Pedro (Calais), é o primeiro a me cumprimentar, seguido por Jorge, Zani (Otávio Cardoso) e Chico (Jardim), que brinca sentado com um contra-baixo em um dos sofás. A banda, que despontou como um dos principais sucessos do pop nacional, parece estar bem relaxada, como se a próxima entrada no palco fosse apenas mais um dia em seu escritório.

No interior desse camarim há de tudo. Desde as coisas mais ordinárias, como equipamentos de som e mesa com comes e bebes, até boias infláveis – usadas para surfar no mar de fãs. Em um volume bem abafado, é possível escutar a plateia que aguarda ansiosamente pelo início do show. Prometo à todos que não vou atrasá-los. Ao meu lado, de pernas cruzadas, Pedro e Jorge fazem algumas perguntas sobre como será a entrevista e o formato da reportagem. Acostumados com os holofotes e veículos mais sofisticados, o quarteto acha engraçado quando saco meu celular do bolso e peço para usarem ele como microfone. “Está ótimo. Bora!”, exclama Pedro, o vocalista, em um tom extrovertido.

Naturais de Minas Gerais, a Lagum carrega nas suas composições influências conterrâneas de harmonia rebuscada, como a forte presença de acordes com sétima e dissonantes, que também aparecem nas composições de artistas mineiros como Skank, Clube da Esquina, Pato Fu e Jota Quest – apesar destes não serem suas principais influências sonoras. Contudo, o seu último álbum “Memórias (de onde eu nunca fui)” (2021) traz referências do pop e reggae que fazem o grupo migrar musicalmente da região de lagos e montanhas de Brumadinho para as praias brasileiras. Diante dessas pontuações, Pedro balança a cabeça em tom de concordância, respira, pega o “microfone” e reflete:

“Esse lance litorâneo no som é muito das influências do que a gente escutou, mas esse último álbum tem algumas músicas que remetem a isso. Eu acho que “Musa do Inverno” é música de praia de Ipanema, com Sol e 40 graus [celsius]. Mas “Playground” é mais de chalé, jacuzzi… (risos) eu acho que a gente é uma banda menos interior, menos fechadinha. A gente já teve a nossa fase mais fechadinha tipo “Não vou mentir”, “Ei moça”, várias assim… e esse último álbum é uma coisa aberta, principalmente o nosso show ele é bem mais aberto”.

 

O disco foi lançado após a morte precoce do baterista da banda Breno Braga, conhecido como Tio Wilson, em setembro de 2020, que trabalhou na sua produção. Com “Memórias (de onde eu nunca fui)”, a Lagum recebeu a sua primeira indicação ao Grammy Latino, na categoria “Melhor Álbum de Rock ou de Música Alternativa em Língua Portuguesa”.

Na sequência, Zani, revela que a banda, no ano passado, passou dois meses morando juntos em uma casa em Campinas, no interior de São Paulo. Esse processo imersivo foi importante para todos os membros se reconhecerem novamente. “Ter esse momento lá foi pra gente conhecer como que nós funcionamos de novo. A gente sentar, passar um tempo junto e entender como que é o outro, de novo, acho que foi um mega processo para nós”, conta o guitarrista.

Pedro então brinca. “Eu acho que a gente tá, aos poucos, mudando, e principalmente, depois dessa imersão que o Zani citou, vai vir uma coisa muito louca… vai rolar uma reviravolta sonora. E eu acho que essa impressão que você tem e essas relações que você fez talvez [sobre a sonoridade] não existam mais no nosso futuro…”.

“E o que seria essa reviravolta dos próximos trabalhos?”, pergunto. Tímido, Pedro sorri. Pensa em uma resposta e rebate tentando se esquivar. “Cara, muita coisa vai rolar esse ano, a gente ainda não tá falando disso… a gente, inclusive, te deu um mega spoiler falando dessa reviravolta sonora (risos)”.

Discretamente, já pensando para quais vertentes a sonoridade da banda poderia migrar, insisto perguntando se o furo que acabaram de me dar teria uma roupagem diferente de outros trabalhos e se já há alguma previsão de lançamento dessa nova fase. Pedro, em tom de voz mais baixo, reafirma que tinha acabado de vazar informações e os demais integrantes da banda caem na gargalhada. Acontece. Em seguida, novamente, se esquiva do assunto afirmando apenas que “vai acontecer uma loucura. é isso”.

Na semana seguinte dessa entrevista, a Lagum lançou o single “Olha Bela”, sendo a primeira música composta somente pelos quatro integrantes da banda. A faixa, que remete a projetos do começo da banda, faz referência daquilo que se pode classificar como “Lagum raiz”. “Vamos dar fim à várias coisas, e início a várias outras. “Olha Bela” foi um lançamento de celebração, que encerra esse momento”, afirma a banda nas redes sociais, comunicando o fim da turnê de verão e dando encerramento a esse capítulo.

O quarteto, que completa uma década de carreira ano que vem, olha para o passado e diz não se reconhecer mais. Nas ruas de Belo Horizonte, as paredes das casas de show guardam algumas memórias do grupo, desde a época em que faziam faculdade e realizavam apresentações cover para juntar dinheiro suficiente e gravar as suas faixas autorais. Nos cases carregavam não só os seus violões, mas todos os seus sonhos, grandes demais para caber dentro da capital mineira. Se hoje enxergam uma maturidade na postura, nos pensamentos e nas músicas, Calais acredita que não seria possível fazer sucesso sem toda a ingenuidade das páginas anteriores.

“Eu acho que a maturidade… [respiro] é você ter casca depois de ter passado por tanta coisa. Passamos por muito e aprendemos. E somos maduros o suficiente. Mas se fosse pra começar tudo de novo, daquele ponto, talvez a gente não conseguiria com a cabeça de hoje em dia. A maturidade deixa um pouco seu pé no chão, ela te traz um pouco para essa realidade… e, às vezes, é bom uma falta de realidade pra conseguir sonhar lá na frente, sacou?”, reflete o vocalista.

Na medida em que o horário marcado para subirem no palco se aproxima, os gritos da plateia aumentam. E os rapazes parecem gostar dessa energia criada pelo seu público. Com fãs apaixonados nos quatro cantos do Brasil, a Lagum venceu consecutivamente três vezes o Prêmio Multishow de Música Brasileira na categoria “Grupo do Ano” (2020, 2021 e 2022), sendo uma premiação feita através de voto popular. “A gente sempre teve uma postura muito aberta com os fãs e eu, particularmente, acho que é uma qualidade muito bacana nossa. A gente tá numa fase de construção de ter o fã ao nosso lado, ter ele próximo da banda. É muito fã clube, muita galera que tem um carinho especial com a gente e também temos com eles, sabe? Essa reciprocidade eu acho muito legal.”, avalia Chico.

A produtora da banda sinaliza com as mãos para que eu termine a entrevista. Como prometi no início da gravação que não atrasaria o show, desligo o gravador de voz, apesar dos entrevistados estarem bem à vontade para dar continuidade a conversa por horas. Quinze minutos depois, subiram no palco.

Ao vivo, o carinho da banda com o público, em diversos momentos de interações, se torna mais evidente. Desde o momento em que Pedro recebe uma camisa roxa customizada com flores de uma fã, e a veste durante o show, até o lançamento de uma boia inflável – uma das boias que estava no camarim – em que o vocalista usa para surfar por cima da plateia. Houve também um canto de “feliz aniversário” para Jorge e uma performance cover de “Tudo o que ela gosta de escutar”, da banda santista Charlie Brown Jr, que fez o público sair do chão.

 

E toda essa interação, que torna o show mais descontraído e cria vínculos com os espectadores, é intercalada por uma performance madura e muito bem executada, sem erros e exalando energia dos músicos em cada faixa apresentada.

 

Esse show, no começo do ano, foi o penúltimo da turnê de verão do quarteto. Um encerramento de fase. Hoje, inauguram um novo capítulo com o lançamento do EP “Fim”. Um recomeço da Lagum que chegará acompanhado de uma Live Session, exibida em seu canal oficial no YouTube a partir das 21h, nesta quinta-feira (16).

 

Autor

  • Daniel Seiti

    Estudante de Jornalismo PUC-SP que adora ir atrás de entrevistados com histórias para contar. Navego livremente pelos oceanos de músicas que cabem em meus fones de ouvido e, às vezes, também dou uns "pitacos" por aqui.

Escrito por

Daniel Seiti

Estudante de Jornalismo PUC-SP que adora ir atrás de entrevistados com histórias para contar. Navego livremente pelos oceanos de músicas que cabem em meus fones de ouvido e, às vezes, também dou uns "pitacos" por aqui.