Nomes grandes do mainstream como Taylor Swift, Lana Del Rey e Clairo se aproximaram do folk em seus últimos trabalhos, mas por quê?  

No meio da febre atual de revival do pop anos 80, sorrateiramente o ‘antiquado’ violão vem influenciando uma nova forma de linguagem na fusão da música alternativa com o pop mainstream. De um jeito curioso, o folk tem sido incorporado não só por causa da vibe intimista do som, mas por trazer implicitamente uma proposta onde o conteúdo das letras tem sido majoritariamente pessoal, diferente dos conceitos extravagantes dos entusiastas do pop dos anos 80. Porém o folk está longe de ser algo nichado, ou tradicional demais. Quando ele não aparece como o principal foco sonoro e estético através de artistas como Phoebe Bridgers, ele se adequa bem a uma configuração mais eclética, como por exemplo nos álbuns mais recentes de The 1975 e Haim. Em meio ao domínio da dance music na música pop, o folk tem se destacado através de trabalhos que vem diversificando a identidade sonora do gênero, com o característico contraste de um som simples com conteúdos profundos. 

* Para uma percepção mais ‘fresca’, separei álbuns lançados nos últimos 2 anos. Também vale dizer que a ordem não é qualificativa.

 

“Shore”, Fleet Foxes (2020, ANTI)

Podemos dizer que Shore, último álbum do Fleet Foxes, é o mais acessível da banda, mas possivelmente o mais intenso. A maior inspiração para o trabalho veio quando o líder da banda, Robin Pecknold, quase se afogou surfando em Los Angeles. A partir dessa experiência, Robin fez um álbum que passa a sensação de alívio ao encontrar a costa da praia (The Shore). Lançado em setembro do ano passado, o álbum acabou ganhando um significado especial para quem estava procurando um ‘porto seguro’ durante o período de pandemia. Esse é o quarto álbum do Fleet Foxes, e se nos trabalhos anteriores o som era um folk mais tradicional, flertando com elementos barrocos e até progressivos, em Shore Robin Pecknold simplifica mais os timbres, com uma presença maior do violão de nylon, e com um arranjo mais minimalista. O álbum também contou com participações ilustres como Christopher Bear e Daniel Rossen do Grizzly Bear, Kevin Morby, e o nosso querido Tim Bernardes d’O Terno. A proposta mais ‘gratiluz’ deu certo, e mesmo 7 meses depois do lançamento, o álbum estava na terceira posição da parada Billboard. Essa foi a melhor colocação da discografia do Fleet Foxes até então.

 

“FLOWERS for VASES / descansos”, Hayley Williams (2021, Atlantic Records)

Dá pra dizer que FLOWERS for VASES / descansos é verdadeiramente o primeiro álbum solo de Hayley Williams. Isso porque o debut dela em Petals For Armor (2020) teve a participação do guitarrista do Paramore, Taylor York, na maioria das composições do álbum. E no som também, Petals For Armor é uma continuação daquilo que o Paramore havia feito em After Laughter (2017). Já em FFV/D, a artista sacramenta sua mudança do emo para o indie mirando numa sonoridade predominantemente acústica, com forte influência do indie folk mais eclético dos últimos anos. Ela já havia flertado com esse tipo de som algumas vezes na sua carreira, sendo a última delas em Petals For Armor mesmo, quando contou com a colaboração de Phoebe Bridgers, Julien Baker e Lucy Dacus na faixa ‘Roses/Lotus/Violet/Iris’. FFV/D foi lançado em fevereiro desse ano, e traz Hayley tocando todos os instrumentos, que vão desde mandolin à piano mudo. 

 

“folklore” / “evermore”, Taylor Swift (2020, Republic Records)

Aqui vai ter que ser ‘dois em um’ pois não tem jeito, a guinada de Taylor Swift ao folk se deu através de dois álbuns descritos por ela como irmãos: folklore e evermore. Depois de todo um transtorno com o empresário Scooter Braun em torno do direito de suas músicas, Taylor decidiu ter um maior controle de suas produções, e derivado disso veio o anseio de compor a dupla de álbuns que marcam a fase mais pessoal da “miss americana”. Com produção de Aaron Dessner, do The National, e Jack Antonoff, ela incorporou o folk não só na sonoridade, mas também na proposta narrativa de contar histórias através das músicas. Como ela tem uma grande ligação com a country music desde o início da carreira, não foi tão difícil encontrar inspiração ao desenvolver a sonoridade dos álbuns. Porém algo que chamou a atenção foi a aproximação com a música alternativa, seja pela presença dos já citados produtores, seja pelos feats com nomes como Bon Iver e HAIM. A fase folk de Taylor Swift se mostrou um sucesso não só de crítica, mas também comercial, lhe rendendo o Grammy de álbum do ano.  

 

“Chemtrails Over The Country Club”, Lana Del Rey (2021, Polydor Records / Interscope Records)

Em sua constante identificação com a estética retrô norte-americana, uma hora ou outra Lana Del Rey iria incorporar o folk na sua discografia. Como ela mesmo disse em entrevistas, ao longo de seus trabalhos é possível ver a influência do gênero na estrutura de suas composições, porém com um arranjo diferente. Em Chemtrails Over The Country Club ela traz não só a sonoridade, mas também o ‘caráter de tribo’ do folk, evocando o seu “Country Club”. De um jeito autêntico, o álbum dá continuidade a proposta mais épica do atual momento da artista, juntando o minimalismo do folk. Com letras que mostram Lana refletindo sobre memórias e pessoas que lhe são caras, o disco mostra a artista explorando suas vulnerabilidades de um jeito ambicioso. Para selar a identificação folk, o álbum fecha com um cover de ‘For Free’, música de Joni Mitchell em que Lana canta acompanhada de Natalie Mering, a Weyes Blood, e cantora de country Nikki Lane.

 

“Titanic Rising”, Weyes Blood (2019, Sub Pop)

Com um som mais psicodélico e de uma certa maneira ‘denso’, o último álbum da Weyes Blood, Titanic Rising, é o álbum da lista que mais se distancia do folk para abraçar outras texturas sonoras, ainda assim, o folk está ali na sua forma mais etérea e sensitiva. Natalie Mering, a artista por trás do alter ego Weyes Blood, se consolidou na última década como um dos principais nomes do indie psicodélico, flertando com uma paleta sonora que vai desde a ambient music ao dream pop. Em todos os seus trabalhos, ela traz uma imersão fantasiosa, que evoca muito do folk progressivo dos anos 70, de nomes como Renaissance. Apesar de ter uma discografia impecável, Weyes Blood só bombou mesmo em 2019, com o lançamento de Titanic Rising. Em seu quarto álbum, Weyes Blood traz chamber pop, soft rock, dream pop, e folk psicodélico, formando uma verdadeira atmosfera sonora potente e sublime. A parte lírica do álbum conta com viagens psicodélicas da compositora, reflexões sobre a perda da inocência ao envelhecer, e os dilemas ao se apaixonar. Um dos pontos altos do disco é a voz de Natalie, que é grave e ‘reta’ lembrando o timbre de Joni Mitchell. A semelhança com Joni também se encontra na cadência harmônica mais complexa das músicas. Fantástico do começo ao fim, Titanic Rising é como se a aurora boreal fosse um álbum.

“Sling”, Clairo (2021, Fader LABEL / Republic Records)

Surpreendendo fãs e críticos, Claire Cottrill, a Clairo, também mergulhou fundo numa folk trip em seu álbum recém lançado, Sling. Depois de uma estreia que correspondeu sonoramente à sua fama de ‘porta voz da gen z’, no segundo álbum ela chamou o requisitado Jack Antonoff para apostar num som retrô que faz referência direta ao folk dos anos 70. A artista citou em entrevistas recentes que entre as influências estão nomes clássicos como Carole King e Carpenters. Para a gravação do álbum, ela foi para o Allaire Studios, no topo do Monte Tonche, para capturar bem esse clima ‘campestre’. O resultado foi um álbum ambicioso, mas minimalista, com foco em interlúdios e texturas abstratas, e com menos batidas em relação ao seu álbum de estreia.

 

 

“Punisher”, Phoebe Bridgers (2020, Dead Oceans)

Quem não é muito chegado em folk pode ter uma visão do gênero como algo ‘tradicional demais’, ou até mesmo ‘som de velho’. Um dos nomes responsáveis por mudar essa imagem com certeza é Phoebe Bridgers. Nascida em LA, a compositora traz em suas letras observações caricatas sobre como ela enxerga o mundo a sua volta, mas não numa perspectiva ideológica ou romântica, e sim a partir da sua rotina de jovem adulta que tem vontade de falar tudo que lhe vem à mente. Às vezes parece um monólogo de humor, às vezes parece uma sessão de terapia, e às vezes só parece um pensamento de um jovem tuiteiro mesmo. Em Punisher, ela entrega um trabalho altamente identificável, embalando sua personalidade engraçadinha com um indie folk que hora vai mais pro country, hora mais pro rock de estádio, hora mais pro indie rock, hora mais pro emo… Enfim, é uma junção de sons caracteristicamente melancólicos. Esse é o seu segundo álbum apenas, mas fora sua carreira solo, Phoebe tem outros projetos, como o supergrupo Boygenius, com Julien Baker e Lucy Dacus, e também o Better Oblivion Community Center, com Conor Oberst do Bright Eyes, que inclusive colaborou em algumas faixas de Punisher. Algo curioso sobre Phoebe Bridgers é que ela realmente conseguiu furar a bolha do seu fandom, tanto pela áurea de jovem comunicativa das redes, quanto pela sua versatilidade musical, que já lhe rendeu colaborações com nomes que vão desde Kid Cudi à Lorde. Fã assídua de Elliott Smith, Phoebe conseguiu capturar esse lado mais soturno do folk alternativo e potencializá-lo numa linguagem à sua maneira.

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Autor

  • Luan Gomes

    Viciado em descobrir sons novos e antigos, mas sem abrir mão de uns hits batidos tipo "The Real Slim Shady" do Eminem. Perde um dia de vida toda vez que vê a pergunta "o rock morreu?"

Escrito por

Luan Gomes

Viciado em descobrir sons novos e antigos, mas sem abrir mão de uns hits batidos tipo "The Real Slim Shady" do Eminem. Perde um dia de vida toda vez que vê a pergunta "o rock morreu?"