“Não é só uma fase, e sim um estilo de vida” representado em um dia repleto de paixão pela sonoridade que marcou uma geração 

O Emo vive seu melhor momento desde seu auge em meados dos anos 2000. O mainstream parece ter abraçado, com artistas tanto do Pop, quanto do Rap, referenciando o estilo. Ao mesmo tempo que grandes representantes do passado, vivem uma nova retomada: Paramore chegou ao status de headliner inquestionável, a volta do My Chemical Romance teve tours esgotadas e celebradas, o Fall Out Boy voltou a fazer música voltada mais ligada ao gênero e seus similares – como Pop Punk e Rock. Ao mesmo tempo que o grande público e artistas que definiram essa época estão numa mesma conexão, começa a acontecer um fenômeno ligado aos grandes festivais, que talvez por um cansaço do formato padrão e da imensa oferta (mas com pouca variedade), começou a se pensar num “novo” modelo: o de festivais temáticos, onde um estilo, uma vibe de som ou época, seria o mote para o evento. Isso não é exatamente uma novidade, porém o jeito que está sendo vendido e pensado, parece ser mais condizente com os tempos atuais, no qual a nostalgia cria uma conexão e devoção mais profunda no público.

Desde festivais que juntam bandas de New Wave e Post-Punk dos anos 80, até outros que focam no Rap dos anos 90 e início dos 2000, tem um evento nesses moldes para todo mundo. E óbvio que uma hora algo nesse esquema ia aparecer em terras brazucas. O I Wanna Be Tour segue os moldes de dois dos mais bem sucedidos conceitos desse tipo de festividade: primeiro e mais recente, o When We Were Young, que levou a Las Vegas praticamente toda uma geração de artistas do Emo, Pop Punk, Metalcore e Post-Hardcore a tocarem em dois dias esgotados e que segue se renovando em um conceito que deve ser copiado por alguns outros eventos – o de agora, a temática além do estilo de som, será o de tocar discos clássicos de cabo a rabo. Já o segundo festival a quem o I Wanna Be Tour deve muito – e até o próprio gênero – é o clássico Warped Tour, que de forma itinerante, descobriu uma infinidade de bandas, foi aos poucos popularizando e solidificando estilos, criando assim toda uma nova cultura.

Um festival pra além da mera nostalgia

Então chegamos a essa semana mágica para os fãs de Emo no Brasil. Entre o dia 2 e 10 de março, começando em São Paulo e seguindo por Curitiba, Recife, Rio de Janeiro e encerrando em Belo Horizonte, o I Wanna Be Tour pode desde já ser considerado um marco no país, pela ambição, dedicação e ousadia que foi concebido. Com line up inspirado, diversificado e nostálgico na medida certa, o evento foi uma mistura de Lollapalooza das primeiras edições, Dia do Metal do Rock in Rio e Monsters of Rock clássicos: um evento que levou pessoas verdadeiramente interessadas em ver um dia por inteiro de música, que abraçam um estilo e tão ali por bandas pelas quais elas elas nutrem uma paixão genuína e longínqua. No dia do festival em São Paulo, no qual esse que vos escreve foi, havia um sentimento de comunhão que a algum tempo eu não vi em evento desse porte. Desde o primeiro show do dia com a Fresno, às 11h da matina (talvez o único erro do festival em questão de horário, pois se tem alguém que manteve essa chama emo e do rock viva nesse país, foi a Fresno. Eles mereciam mais destaque), o Allianz Parque já estava MUITO cheio. Foi bonito ver as trocas de palavras e canções sendo entoadas em uníssono, por banda e público. A EMOção já começou lá em cima.

Mas ainda assim, uma coisa precisa ser comentada: será que tem a necessidade de começar TÃO cedo assim? Eu consegui transitar bem entre o interior do estádio e os palcos, pois não fiz tanta questão de ficar lá no meio ou na frente dos palcos, mas e quem quis ficar vendo seus artistas favoritos o dia todo lá? Eu vi muitas pessoas passando mal pelo calor e visivelmente queimadas de sol. Os próprios artistas tinham uma preocupação com isso, a todo momento lembrando para as pessoas beberem água e usarem protetor solar (com o trauma ainda muito forte do Furacão Swift pelo país e que talvez pelo sonho de ter um evento desse realizado aqui, que tudo ocorresse bem). Além do cansaço para se ver um dia inteiro assim de artistas – porém é importante salientar, o público se manteve intensamente comprometido até o fim das atrações. Um outro fator que tem que ser pontuado: o som no meio dos palcos estava bem comprometido. Eu estava na pista premium e se em outras oportunidades no próprio estádio consegui ouvir bem o que rolou, nesse dia bandas com um som mais pegado como Asking Alexandria ou A Day to Remember, me soava bem oco, como que saindo de uma caixa. Só quando fui para as laterais que o som vim bem mais condizente com a potência das apresentações. Não sei se teve algo a ver com a profundidade dos palcos ou com eles serem lado a lado, mas é algo a se pensar mais para frente.

E sobre os shows em si, eles entregaram o que se esperava dos fãs: Fresno como um grande representante do passado, presente e futuro do gênero e como eles já são uma das grandes bandas de rock que esse país já teve. Plain White T’s e Boys Like Girls uma boa fusão de love songs, o lado mais romântico do estilo, mas sem perder a pegada mais forte quando necessário. Mayday Parade seria o lado mais underground, que entende seu tamanho e se aproveita disso como uma arma para fazer uma performance muito segura. Pitty em um show de devoção a um disco que fez história, quando tudo ainda era mato. The Used mostrando o motivo de ser uma referência no estilo – seja em apresentação, quanto pira no seu som. Grande apresentação. Assim como All Time Low que demonstrou um carisma absoluto e tamanho de show para estar presente tanto em um Lolla como em um Rock in Rio. The All-American Rejects com cara de bandão, mesmo que eu sinta que dos shows do fim do dia, foi o que faltou um tempero a mais. Dito isso, fez muito sentido a trinca final, NX Zero / A Day To Remember / Simple Plan. Os três, cada um a seu modo, fizeram shows muito particulares e que mostram o motivo do gênero ser tão amado – shows dignos de headliners para um evento desse escopo.

É bem emocionante ver uma banda como NX ter a proporção que tem hoje em dia. Já era muito sucesso antes, mas ver um estádio – o mesmo que viu noites lotadas deles antes – cantar com a mesma energia os grandes hinos deles, foi algo a se admirar. Já o ADTR foi bem impressionante ver como o público br gosta dos caras. E eles fizeram a todo momento questão de afirmar o como aquilo era recíproco, com uma apresentação arregaçante de boa. Já tinha gostado dos shows que tinha visto deles no Lolla e na Audio, mas francamente, aqui nessa posição, só me fez admirar mais ainda os caras. Que voltem logo! E para fechar uma banda que sempre tive a curiosidade de ver, por como foi importante na minha adolescência, o Simples Plan é diversão em forma de banda. Entende como fazer tudo virar uma grande festa, abraça sem pudor o sentimentalismo nas baladinhas e sabe como interagir com o público sem soar forçado demais. Você vê que nitidamente os caras sabem ser uma banda entende seu papel nesse gênero, e jogam muito bem com as cartas que tem. Aqui a nostalgia me pegou mais forte que qualquer outro momento do dia.

Essa primeira impressão que tive com o I Wanna Be Tour foi bem positiva, acho que como qualquer evento, tem coisas que podem ser pensadas para ser aprimoradas e melhorar a experiência do público, mas francamente, se eles continuarem a darem voz ao que importa, acho que o público vai continuar muito satisfeito: um dia dedicado ao melhor que o Emo e seu “primos” podem nos presentear.

Autor

Escrito por

Pery Andrade

Ex-estudante de Cinema, além de comunicador, nerdola da música e criador de conteúdo desde 2014 no Canal Musicalize.