Edição 2022 do Festival Sensacional acontece pela primeira vez no Parque Ecológico da Pampulha com quase 40 atrações
Aos poucos as coisas vão voltando ao normal. Não exatamente ao que era antes da pandemia (que ainda não acabou), mas algo próximo a isso. No último dia 2 de julho em Belo Horizonte, no Parque Ecológico da Pampulha, aconteceu o Festival Sensacional. O evento, que acontece desde 2010, teve quase quarenta atrações divididas em quatro palcos com apresentações de artistas dos mais diferentes estilos como Letrux, Liniker, Baco Exu do Blues, entre outros e foi minha volta ao mundo presencial e aos eventos de música.
O festival já começa a dar as caras com a movimentação ao redor do local do evento. O público que chegava era formado majoritariamente por pessoas pretas, comunidade LGBTQIA+ e diversas outras minorias. Um “povo animado”, como diria a poeta. Isso transformou o lugar num ambiente acolhedor e com mais liberdade de ser quem se era, sem medo de ser feliz. E, falando em minorias, alguns palcos contavam com espaços para pessoas com deficiência e até intérpretes de libras. Nesse que passamos assistindo a lives e fazendo reuniões via chamada, nada mais interessante e ideal para um retorno do que um ambiente acolhedor e livre de preconceitos como esse.
O Festival Sensacional se tornou então, um cenário ideal para um discurso político obviamente de esquerda que transparecia, para além das características pessoais, em suas roupas, acessórios, bonés e até leques que pregavam o nome do candidato que está à frente das pesquisas atualmente. Quem não tinha ido preparado, podia ganhar um adesivo logo na entrada para colocar em sua roupa ou onde quisesse. Discurso esse que chegou até aos palcos com artistas cantando a favor do mesmo candidato e contra o atual governo que encontra ainda um certo apoio em um outro gênero musical universitário. Eu como homem preto, endossei o coro.
O espaço escolhido para o evento foi um grande acerto. Uma área ampla em que era possível assistir aos shows sem muito aperto, claro que quanto mais próximo da grade menor o espaço disponível. Mas, para quem queria curtir de forma mais tranquila, era possível ficar numa distância boa sem perder nada do que estava acontecendo nos dois palcos principais que eram chamados de “Palco Itaipava 100% Malte” e “Palco Smirnoff”. Quando vi a proximidade dos dois no mapa do evento a primeira vez, fiquei preocupado. Me lembrou uma edição do Lollapalooza, quando ainda era no Jockey Clube e uma tenda eletrônica ficava muito próxima a um dos palcos e, dependendo de onde se estava, ouvia mais da tenda do que do próprio palco.
Entretanto, os palcos foram montados como se fosse um único palco gigante dividido no meio. E, quando ocorria a apresentação de um lado, do outro não tinha e vice e versa. A logística acredito que, primeiro foi para economizar cabos e segundo otimizar tempo. Ao invés de um palco principal em que se espera um show terminar para montar para outro artista você já agiliza as coisas enquanto o outro está se apresentando e evita atrasos. Que aliás, todas as apresentações aconteceram de forma bem pontual. Os demais palcos também foram distribuídos de forma a não interferirem um no som do outro e proporcionar maior conforto para o público. E entre eles, ainda você tinha a chance, numa caminhada para ver o que tem ali naquele canto, encontrar uma apresentação meio circense e muito alegre como foi da Belina Orkestar que tinha perna de pau, metais e muita alegria no meio.
Ponto positivo também para a estrutura. Não tinha aperto nem fila para conseguir fichas para comprar bebidas ou alimentos e na hora de buscar nas barraquinhas também era tudo muito bem controlado. Sempre que precisei buscar algo, não demorei mais que cinco minutos e nem ficar gritando tentando chamar atenção de uma atendente que já estava de saco cheio. Caso precisasse de sentar, a praça de alimentação também proporcionaria espaço suficiente para fazer seu lanche ou apenas descansar suas pernas para quem, como eu, já não tem mais o mesmo pique de ficar em pé como aos 20 anos. A mesma coisa se aplicava aos banheiros que atendiam muito bem as expectativas. Por que se tem uma coisa que estressa o brasileiro é a tal da fila.
Estando no meio do povo, o movimento das multidões dava o indício de qual artista estava prestes a se apresentar. Em cima do palco, Francisco El Hombre conseguiu captar a energia da galera de uma forma incrível. Músicas como Tá Com Dólar, Tá com Deus, animava quem assistia e mostrava o forte cunho político que está presente no grupo. Em outro momento, foi convocado à frente do palco os presentes que se identificavam como mulheres para formar o coro de Triste, Louca ou Má. Mas um dos momentos mais interessantes do show foi a performance meio micareta da banda com a canção CHÃO TETO PAREDE:: Pegando Fogo em que éramos convidados a fazer uma coreografia junto à banda. A apresentação terminou com um dos vocalistas seminu, mostrando uma cueca, acredito que não por acaso, vermelha e pegando todo mundo de surpresa.
Um pouco antes do final da apresentação, a multidão começou a se mover para o outro palco. Era a proximidade do show da cantora Liniker que iria se apresentar logo em seguida a Francisco El Hombre e seus fãs queriam ficar o mais próximo possível da cantora. Tanto o palco quanto suas roupas eram cheias de muito brilho que refletiam a sua própria presença e encanto na plateia. Ela ainda dividiu o palco com a cantora Tulipa Ruiz. Mais tarde no mesmo palco também se apresentou Letrux junto com Mahmundi.
Mais tarde, a multidão mais uma vez fez seu movimento, dessa vez de uma maneira mais enxuta, o que indicava ser o show mais esperado do dia. Era a apresentação de Baco Exu do Blues. O rapper, um dos pretos mais bonitos da música brasileira atual, tem uma presença bem marcante nos palcos. Uma força que emana e contagia a plateia e que canta tão alto que quase abafa a voz do cantor. Braços para o alto e pulos no ritmo das canções compunham o cenário do momento. Assim como nos outros shows, tivemos momentos políticos e quando os presentes começaram a gritar o nome do atual presidente em protesto, Baco disse “nós não dizemos o nome do nosso inimigo” e puxou uma canção de apoio ao candidato de esquerda que já havia surgido nas roupas e discursos anteriores.
Findo o show de Baco Exu do Blues, boa parte da plateia se dispersou para outros ambientes, assistir a shows de palcos menores, comer ou até ir embora. Enquanto isso, uma parte ainda esperava para a última apresentação dos palcos principais, que foi Olodum e Russo Passapusso. Eu tenho a impressão que essa foi uma escolha pensada para não tumultuar a saída. Baco, que era a atração mais esperada como último a se apresentar, poderia dificultar a saída com todo mundo indo embora de uma vez. Colocando mais apresentações para o final, é possível parcelar a saída de pessoal e aliviar ao menos um pouco o caos de final de festival.
Foi a primeira vez que fui ao Festival Sensacional e ao final, ficou uma vontade de voltar. A organização não deixou nada a desejar, espaço amplo e sem filas e dificuldades para ir ao banheiro, se alimentar ou beber. Atrações das mais diversas e sem problemas causados pelo público. Pelo menos não vi brigas nem nada do tipo. Um sábado agradável que a muito tempo não tinha. Foi um bom retorno para o mundo dos shows e festivais “pós” pandemia.