O duo goiano Can Sad, formado por Henrique Agahdez (baixo) e Luís Feitoza (bateria), lançou seu álbum de estreia em março de 2024, “escatologia”, uma obra instrumental que aborda a saúde mental de maneira profunda e inquietante. O termo “escatologia” refere-se a uma doutrina sobre o fim dos tempos, um conceito que a banda explora tanto na estética sonora quanto nas temáticas implícitas em suas composições.
Mesmo sem contar com letras profundas, digo, nem sequer conter letras, apenas sendo um álbum de rock instrumental, o álbum consegue transmitir uma mensagem poderosa sobre o desgaste emocional e psicológico que permeia a sociedade atual. O duo utiliza suas redes sociais, especialmente o perfil no Instagram (@oicansad), para reforçar essa conexão com a saúde mental, uma questão que, segundo eles, está diretamente ligada à opressão do capitalismo, que contribui para o sofrimento individual e coletivo. A crítica é polêmica, mas a banda sustenta sua visão com uma sonoridade que reflete esse desconforto e angústia.
Musicalmente, “escatologia” é uma fusão de rock industrial, math rock e rock instrumental, criando um clima pesado e denso que representa a fragilidade da saúde mental. As faixas “F”, “Burnout”, “Só Dói Quando Importa” e “Nós Dois Somos Um” são exemplos desse som corrosivo e agressivo, com linhas de baixo marcantes e uma bateria poderosa, que criam uma atmosfera de desconforto e tensão. Sendo “F” e “Burnout”, sendo as mais angustiantes de se ouvirem, pois ambas possuem um clima de inquietude, ansiedade e claustrofobia.
O álbum também apresenta um toque de brasilidade que enriquece sua diversidade sonora. A faixa “Brazuca” destaca-se ao misturar elementos de math rock e samba, enquanto “Samba Enredo Para o Fim do Mundo” transforma o ritmo tradicional do samba em uma peça de rock industrial, algo raro e ousado no cenário musical atual. A diversidade sonora se completa com a faixa “Para cada dor, a próxima estação”, que introduz a viola, o lo-fi e oferece um momento mais calmo e contemplativo, contrapondo o restante do álbum, que retrata uma sociedade acelerada e desumanizada.
Mas “Lorem Ipsum” é a faixa que consegue transmitir o conceito do can sad, ser um rock instrumental, com uma brasilidade que cehga a ser grosseira, com tanto swing que essa faixa consegue trazer. Apesar da relevância do tema da saúde mental, Escatologia não tem ganhado a atenção merecida. O álbum apresenta uma mensagem urgente e necessária sobre o cuidado com o bem-estar emocional, mas a sua recepção tem sido discreta, talvez por não seguir a tendência comercial de artistas mais acessíveis ou populares.
can sad trata a questão da saúde mental com seriedade, sem espaço para superficialidades ou piadas, conforme o duo nos contou na entrevista exclusiva que eles deram a nós do Minuto Indie. A banda acredita que o capitalismo contribui diretamente para o agravamento desse quadro, uma visão que se reflete tanto nas composições quanto nas postagens e posicionamentos online. Escatologia é uma obra que busca provocar reflexão e sensibilização sobre a necessidade de tratar a saúde mental com a devida seriedade.
Embora “escatologia” não tenha obtido grande repercussão até o momento, ele marca uma estreia poderosa do can sad no cenário do underground e da música brasileira. Com uma sonoridade complexa e uma temática impactante, o álbum convida os ouvintes a refletirem sobre o estado atual da saúde mental e o impacto das condições sociais. O duo goiano criou uma obra densa e inquietante, que, embora não chegue ao grande público, oferece uma perspectiva crítica e artística que merece ser ouvida e discutida.